A Ciência da Linguagem como Ferramenta Estratégica na Formação Publicitária: reflexões do primeiro semestre da disciplina de Língua Portuguesa na ESPM

No universo da publicidade contemporânea, comunicar deixou de ser simplesmente “falar bem”. Em um mercado global saturado de signos, as marcas precisam compreender os fundamentos profundos da linguagem, suas variações, seus efeitos simbólicos e sua capacidade de criar sentido. É dentro dessa perspectiva que a disciplina de Língua Portuguesa, parte da nova grade curricular do curso de Comunicação e Publicidade da ESPM, insere-se de forma estratégica e necessária.


Logo no primeiro módulo, os alunos foram introduzidos à ciência linguística moderna, fundada por Ferdinand de Saussure com o Cours de Linguistique Générale. Compreenderam que a linguagem não espelha passivamente o mundo, mas o organiza, estruturando sentidos compartilhados. Situamos o português falado no Brasil dentro do panorama das línguas indo-europeias e latinas, discutindo tanto sua herança do latim quanto suas transformações históricas e culturais. Este conhecimento não é mera erudição: para o profissional da comunicação, conhecer as origens e variações de sua própria língua permite atuar com maior segurança em cenários de internacionalização e adaptação de campanhas, evitando ruídos culturais e otimizando a precisão discursiva.


O curso aprofundou ainda as estruturas gramaticais da norma culta e avançou na aplicação de conceitos centrais da linguística às práticas publicitárias: teoria da enunciação, retórica, sociolinguística e semiótica.

Os estudantes analisaram campanhas reais, desvendando como marcas constroem ethos, pathos e estratégias de persuasão, e aplicaram os modelos de Jakobson e Saussure para compreender as funções comunicativas presentes nas peças de mídia. Em um dos núcleos mais aplicados da disciplina, os alunos realizaram pitches publicitários simulados. Analisaram problemas linguísticos concretos em campanhas e propuseram soluções discursivas e posicionais, considerando públicos, culturas e estratégias de reposicionamento. Nestes exercícios, aplicaram também conceitos da sociolinguística variacionista (variação diatópica, diastrática e diafásica), além de temas ligados à ética discursiva e à responsabilidade comunicacional.


Outro eixo relevante foi a introdução à tradutologia moderna e aos processos de localização de campanhas. Discutimos os conceitos de domesticação e exotização, mostrando como o publicitário atual atua como tradutor intercultural. Em um mercado global, uma campanha concebida localmente pode ser veiculada em múltiplos países em tempo real. Sem domínio das variações culturais e pragmáticas envolvidas, há riscos significativos de fracassos estratégicos e danos reputacionais.


O humor na publicidade foi abordado com apoio na teoria freudiana do chiste, analisando a linha tênue entre o riso inclusivo e o excludente. Casos reais de crises originadas por piadas mal calibradas ilustraram como o humor exige leitura refinada dos códigos culturais de cada audiência. A disciplina também explorou os fundamentos filosóficos da comunicação a partir de Martin Buber, permitindo aos alunos compreender o discurso publicitário como construção relacional de identidades: o diálogo entre o eu da marca e o tu do consumidor. A publicidade eficaz não apenas vende produtos, mas estabelece vínculos simbólicos e molda valores partilhados. Por fim, discutimos a centralidade do storytelling e da oralidade nas campanhas atuais. Mais do que contar histórias, o publicitário precisa dominar o ritmo narrativo, o encadeamento lógico e emocional, e as formas de captação do público em diferentes plataformas e linguagens.


A partir dessas bases, os estudantes foram convidados a refletir sobre o publicitário como filólogo do presente: um leitor atento das culturas contemporâneas, capaz de decifrar signos emergentes, antecipar tendências e construir discursos alinhados à pluralidade social. Este conceito sintetiza o diálogo entre humanidades e prática mercadológica que propusemos ao longo do semestre. A disciplina de Língua Portuguesa, portanto, não se limita à gramática normativa: ela funciona como um verdadeiro laboratório de análise discursiva e estratégia comunicacional, desenvolvendo nos estudantes competências interculturais, éticas e criativas, essenciais à atuação publicitária do século XXI.


O semestre encerra-se com a certeza de que essas bases acompanharão nossos alunos por toda a carreira. As palavras seguem sendo as matérias-primas do publicitário. E na ESPM, trabalhamos para que saibam manejá-las com rigor técnico, sensibilidade cultural e responsabilidade social.

Prof. Dr. Rodrigo Bravo
Professor de Linguagens (Língua Portuguesa)
Curso de Comunicação e Publicidade – ESPM São Paulo

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